terça-feira, 8 de abril de 2008

cinza


Não sei como é a morte. Não parece ser muito gente fina. Ela leva pessoas que não conhecemos, mas leva também os próximos, os amigos, os queridos, os amados. Uma hora, a cordinha da vida acaba e a sensação é exatamente esta: a de puxar num carretel aquele tanto de linha que não sabemos direito quando e onde vai acabar. Uns vivem quilômetros de linha, outros, bem poucos metros. Perdi alguns na vida: foram duas avós, uma quando eu tinha apenas seis anos de idade e a outra mais recentemente, há uns poucos anos. Um avô paterno em 1989. Um primo da minha mãe que o tínhamos como tio em meados de 90. Um melhor amigo de um amigo no final dessa mesma década. Uma filha recém-nascida de um grande amigo. E não muito mais do que isso.

Nessas últimas três semanas, dois pais se foram. O pai do André, colega professor de uma escola e o pai do Césio, hoje. Fui ao Jardim das Palmeiras duas vezes em tão pouco tempo. Fiquei ao lado do Eduardo, um amigo que perdeu a mãe e nunca, nunca se conformou. Conversamos sobre tudo, mas volta e meia seus olhos marejavam, lembrava da mãe, certamente.

Eu tento pensar que a morte é mais uma etapa da vida. Repito isso comigo sempre, porque uma hora ela vai chegar pros meus muito próximos também. Meu pai já é um senhor com idade avançada (mas com cabeça de criança), minha mãe também. Fora meus tios, primos, irmãs, amigos, esposa que estão todos sujeitos a encontrar o final da cordinha e o carretel parar de girar.

Eu tento lembrar das coisas que aprendi nas religiões pelas quais me interesso. Tento acreditar na materialidade da carne, que se desprende da alma num momento x da vida e deixa esta última sempre viva, mas seguindo outro caminho, um caminho diferente que todos tentamos entender, mas nunca aceitamos sem antes derramar o pranto da saudade, da falta, da ausência.

Quando enterraram o pai do Césio, o Eduardo falou que essa é a pior parte, porque você volta pra casa e tem a certeza de não ter mais a presença da pessoa ali. Deve ser muito foda pra nós que ficamos. Para os que vão, acho que se cuidaram bem dos próximos um mínimo, deve ser uma boa viagem de compreensão do que tanto buscamos entender: o sentido da vida.

Talvez seja só isto: o sentido da vida é transformar-se sempre, como a fênix que renasce de suas cinzas, mas nunca volta a mesma, sempre com algo a mais. Talvez seja só sentimentalismo e melancolia. O fascínio pra alguns, o lúgubre pra outros, a redenção pros artistas, o insólito pra uns tantos, a sabedoria pra uns poucos.

4 comentários:

Branna L. disse...

(sem comentários)
...
Realmente a "sabedoria para poucos". Talvez apenas para os que buscaram e conseguiram entender o "sentido da vida", sem se preocupar se havia ou nao poucos milimetros de linha no carretel.

Jéssi disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Jéssi disse...

Nossa Gugaaa...
Esse foi o primeiro post seu que eu não morri de rir,pq ele não é pra rir e sim pra refletir.
Fiquei até meio arrepiada com o que escreveu.é realmente preciso ter uma profunda sabedoria para conseguir entender pq a vida acaba e pq Deus,ou seja lá o que for,nos tira de perto as pessoas que amamos.Eu particularmente não estou preparada para entender e sentir na pele a perca de alguém próximo de mim.Não sei nem qual seria minha reação e espero não saber tão cedo.Apesar de ser espírita que acreditar,como vc,que o espírito se desprende do corpo não me acalma comparando ao tamanho do sofrimento que deve existir para os que ficam numa hora dessa.
Mas,como vc disse,um dia a linha vai acabar.yocfc

Paula § Danna disse...

Creio que a vida é só uma experiência Divina.. é como um teste.. se passou, vai.. se reprovou, também vai!
As consequências só Ele poderá ditar!

seguimos firmes.. um dia todos iremos.. isso me acalma um pouco!!