sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Revisão UFG, dá uma olhada aí, ficou muito bonitinho. Descompacte, clique duas vezes sobre o prezi e seja feliz. Ah, faça uma boa prova também!
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http://www.mediafire.com/?hdrzdipgbs20de2

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

a (flor da) pele que habito

      "Almodóvar é sempre um clássico" "Adoro as cores do Almodóvar" "Nós nunca sabemos no que vai dar" "Prefiro os antigos dele" são constantes nos burburinhos dos intelectuais e dos nem-tanto que frequentam o cinema e conferem as obras do diretor espanhol. Devo dizer que, apesar de a introdução dar a entender que não faço coro a esse discurso, na verdade estou no grupo dos nem-tanto. Então os clichês nas falas dos outros sobre o diretor eu costumo ecoar.
Elena Anaya numa cena linda do filme
      Felizmente, uma obra dele é sempre uma conversa franca sobre tabus. Em tempos de piada de mal gosto afetando as pessoas como crimes hediondos, esses mesmos crimes na tela de um diretor hypado como ele nunca são demais, afinal, ele os "problematiza", os discute, os expõem na mesma medida em que os transforma em assombradas verdades, escondidas nas brutalidades meramente humanas. 
       A pele que habito é um filme diferente de tudo o que já vi. Inclusive eu colocaria a obra na seção de drama na minha locadora (caso eu tivesse uma), mas não sem hesitar em pô-la junto aos thrillers. Como thriller deixa a desejar. Como drama, no entanto, não mata a gente como em Tudo sobre minha mãe ou Fale com ela. Mas dá pra arrancar uns suspiros de dó. Dó de tudo, inclusive. As de sexo, por outro lado, são quentes, intensas, sem ser descritivas. O diretor sempre retratou o sexo com devida sutileza. Mesmo os estupros nunca são o clichê. Basta lembramos de Kika e a hilária cena em que é violada. Quem é que pode rir de um estupro? Almodóvar provoca.
       Vi pouco as cores que geralmente inundam a tela como se fosse mesmo uma obra plástica. Os enquadramentos continuam lindos, mas pela atmosfera mais sombria do filme, as cores estão mais opacas (porém não menos bonitas). 
         Os atores nas mãos de Almodóvar comem em sua mão. Obedecem ao diretor como o filho que tem medo do pai. Inclusive achei o Banderas menos expressivo que de costume. Já o vi mais vivo.
       Agora, a história tem um tom de humor negro inevitável. Irrepreensível. Confesso que não me diverti com a desgraça dos personagens, mas que havia momentos de desconfortável vontade de rir, ah, isso houve em vários momentos. Não vou bancar o spoiler aqui e ficar adiantando os fatos. Vão ver o filme, ta no Bougainville/Lumière. 

Nota: quero retomar minha cinecultura. Fiquei anos indo ao cinema vez ou outra. Estou no clima de fazer com o cinema o que fiz com a literatura. Faça o mesmo. Internet é bom, mas não é o único lugar que deve nos divertir. VÁ AO CINEMA!

terça-feira, 25 de outubro de 2011

neve vermelha

Sofri para ler Branco neve vermelho Rússia, da polonesa Dorota Masłowska. Eu não sou fã de beatnik, literatura à qual a autora parece se afinar bastante. Os intermináveis fluxos de consciência e discursos indiretos-livres dominam toda a narrativa, que se limita a alguns poucos fatos, entrecortados por muita viagem de anfetaminas e pouco sexo. Esperava mais sexo nesse livro, não sei. Os drogados poloneses retratados por Dorota não transam.
A história de um personagem sem-lugar em seu país é o duto que escoa, pelas letras de Dorota, a realidade de uma parcela do povo polonês, sem referencial depois do mundo não ser mais bipolar. (aliás, acho que o mundo está é cada vez mais bipolar)
Demorei de agosto até semana passada (outubro) pra conseguir ler o livro. Simplesmente não fluía. Essa chapação toda me enche o saco. Não suporto juventude sem perspectiva e querendo ser sem perspectiva e não tendo outra alternativa a não ser: não ter perspectiva. 
A história não tem início. Da mesma forma, também não tem fim. O enredo nada mais é que um recorte na vida do personagem. Não sei se é porque sou muito ligado à tradição da narrativa com todas as reviravoltas que culminam num clímax, qualquer clímax, e depois se desfecham (ou acabam antes disso), mas pra mim BNVR é verborragia pura. Admito que é massa ver uma jovem de 18 anos (na época da publicação do livro) publicando um livro que foi traduzido para várias línguas, ganhou alguns prêmios e chamou a atenção pela "ousadia" discursiva e, guardadas as devidas comparações, originalidade. Criei expectativa demais com a história. Esperava algo retumbante como a Clarice em suas primeiras obras. Nada disso; literatura ruim pra mim, apenas.
Reforço, entretanto, que considero importante ler de tudo. Várias vezes me passou pela cabeça desistir daquele livro, mas a persistência em me firmar como leitor disciplinado superou essas vontades. 
Não conheço mais dessa autora, não sei se publicou outras coisas. Se o fez, não vou atrás pra ler: tenho uma pilha enfileirada em dominó pra eu ler. Mas se cair na minha mão novamente e tiver uma proposta diferente dessa, posso até me arriscar. Sei lá, daqui uns dez anos.

domingo, 2 de outubro de 2011

referências

Referências são os pontos para os quais olhamos e para onde queremos ir. Referências são as bases nas quais nos sustentamos para seguir em frente. Referências nos estimulam, nos incitam, nos fazem refletir, querer alcançar pontos inalcançáveis. Referências nos emocionam, mas sobretudo referências nos tornam seres vivos e pensantes. Uma pessoa sem referências é uma pessoa ignóbil.
Dia 28 de setembro, pouco antes de dormir, minha timeline do Twitter foi invadida por uma notícia que eu não quis aceitar e pensei tratar-se de trote: o vocalista do Cólera, Redson, morreu de uma parada cardiorrespiratória. Antes de dormir, dei a notícia à minha mulher, adormeci às lágrimas incontidas.
O outro dia foi uma merda. Dei aula sem graça. Perguntavam do Rock In Rio, eu contava brevemente como tinha sido, voltava pra matéria tentando esquecer que o rock faz parte da minha vida.
Estive um dia de luto. Um dia. Na sexta eu já estava ok, porque o Redson não morreu de verdade. Eu o vejo nos meus álbuns do Cólera, nas letras dele, nas músicas, nas fotos. Vejo-o nas minhas letras, nas minhas músicas, nas escolhas que fiz pra vida. Ele foi mais importante pra mim do que muitos parentes próximos. Se hoje penso que pode haver um amanhã melhor pras gerações que vêm, é porque na minha adolescência eu conheci o Cólera e as letras e músicas do Redson. 
"Quanto eu passo as noites nas esquinas/ esperando um ônibus que nunca vem/ vejo mulheres prostituídas, tento imaginar por quê/ vejo moleques, rasgados, perdidos, não têm um amigo/ mas por quê?/ Dê uma olhada pra essas vidas/ onde estão os direitos de viver?/ Eu me lembro, falam na declaração/ que nascemos livres, livres, por iguais/ mas não entendo se escolhemos/ ou se alguém escolheu por nós/ não está certo, alguns estão ricos/ outros não têm nem um amigo/ Dê uma olhada pra essas vidas/ onde estão os direitos de viver?"
Depois de ouvir/ler essa música aos meus 16, 17 anos, eu nunca mais fui o mesmo. A partir dali, eu estava num processo irreversível de transformação para buscar um mundo melhor e de lá pra cá, pouca coisa mudou. Fiquei mais embrutecido, menos sensível, mas ainda acreditando. Perdi a inocência, mas não o otimismo. 
Sangue Seco com Redson ao centro em 2007, em Palmas
Eu perdi um ídolo, mas suas ideias nunca morrerão em mim ou nos outros moleques de 16, 17 anos que estão conhecendo o Cólera agora e transformando suas vidas concretamente. O discurso soa religioso, eu sei. Mas a indignação e o inconformismo não fazem parte de adorações, mas de detestações. O mundo punk compartilha isso, independente da corrente ideológica. Todo punk é um indignado. Os que têm o Cólera como referência, além de indignados são otimistas. 
No sábado, 1º, teve um show histórico em Goiânia. Olho Seco, banda seminal do punk junto ao Cólera, tocou aqui na cidade, voltando às atividades depois de quase uma década parado. O Ímpeto, uma de minhas bandas, abriu mão de tocar as próprias músicas no show de abertura desse evento e tocou apenas Cólera, do começo ao fim. Foi nosso jeito de homenagear aquele que nos influenciou. Se tocamos alguma coisa, muito se deve ao Redson e ao Cólera. As pessoas gostaram, choraram, cantaram conosco e fizeram um espetáculo lindo. Aquele espírito é o que temos de carregar conosco no dia a dia pra enfrentar todas as pedras que jogam na nossa cara toda hora. Pra aguentar a merda do mundo, preciso fazer algo que vá contra ela, preciso acreditar que ser adolescente não é uma fase, mas uma escolha de vida. "Eles dizem que você é doente, e que isso é fase de adolescente mas não! Não vá se entregar!", gritava o Redson no melhor disco do Cólera: Pela Paz Em Todo o Mundo. Nunca ouviu? Baixe aqui.
Eu hoje estou feliz. Feliz porque sei que o Redson cumpriu seu papel aqui. Foi embora cedo, "os bons morrem jovens", cantava Renato Russo mais uma verdade. Morreu cedo, mas não deixou nada a dever a ninguém. Só a crescerem cada vez mais. FORTE E GRANDE É VOCÊ!!!

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

contido

mesmo que não fizesse
ainda que não fosse
embora estivesse sem
porque não tem
pois é certo que foi
talvez não tão
quanto pudesse fazer
se alterasse o
obter-se-ia um
porém, é óbvio que
não poderia querer
porquanto essa variação de 
me mantivesse tão
[contido]

domingo, 14 de agosto de 2011

resenhas preguiçosas

Sei que estou sumido, meus cinco leitores. Sei que vocês querem tirar o Tessitura dos seus favoritos e enviá-lo aos bloqueados. Mas tenham dó desse pobre escritor sem ideias e com preguiça extrema. Assunto não me falta. Falta disposição para escrever sobre tudo o que tenho visto. E tempo também, sempre ele.
Depois de "Histórias extraordinárias", do Poe, li "Pequenas criaturas", do Rubem Fonseca, "Mundos invisíveis", do Marcelo Gleiser, "Demian", do Hermann Hesse, "A grande arte", do Rubem Fonseca novamente (to viciado nesse cara) e comecei um romance polonês de uma escritora chamada Dorota Maslowska que é bem no estilo beat, anos 70 e tal. Mas a história é desses tempos, os personagens têm celulares, rs. To desbravando as primeiras páginas, nem tenho opinião ainda sobre o que estou lendo.
O certo é que não resenhei nenhum desses livros que li de março pra cá e temo o tempo passar e eu perder a referência. Afinal, uma das razões de eu ter querido resenhar o que leio é na tentativa de eternizar minhas impressões sobre o que li. Mesmo sabendo que quando eu reler algumas dessas obras minha cabeça será outra, gostaria de saber o que eu pensava na época.
Então, pra eu não perder o fio da meada e nem vocês me abandonarem definitivamente, resolvi fazer comentários breves sobre essas obras. Estou com muita coisa na cabeça. Queria escrever um romance do Néverton, o personagem desse último texto que escrevi em junho ainda. Mas não senti uma resposta positiva dos meus leitores. E eu não quero escrever mais só pra mim, como já faço com as resenhas. Não quero confetes, queria uma resposta. Qualquer uma. Ando carente de estímulos. Ando preguiçoso. Preciso escrever. 
Vamo lá.
Pequenas criaturas - Rubem Fonseca produziu uma sequência de contos com personagens com conflitos típicos de crônica. Pequenas desgraças cotidianas seria um bom nome para a obra também. Mas é claro que "Pequenas criaturas" é muito superior, pois resume em duas palavras a verve de todos os personagens do livro. Alguns parecem mais significativos, como o garçom assassino do conto "Ganhar o jogo", outros, porém, como o velhote banguela e cadeirante do primeiro conto é de dar dó. Você ri da desgraça alheia porque se coloca no lugar dele e pensa, que merda de vida. E nós somos os brasileiros, esses miseráveis que riem da desgraça do outro, mas riem da própria desgraça também. Aliás, antes que outros riam; orgulhamo-nos. O livro é ótimo e faria uma excelente resenha dele se não fosse essa preguiça.
Mundos invisíveis - Marcelo Gleiser. Eu já gostava dos artigos do Gleiser na Folha, mas nunca tinha criado coragem de ler um livro seu. Medo de passar o que passei lendo "O universo na casca de noz", ou seja, incompreensão de 70% da obra do Hawking. Mas eis que me surpreendo com uma obra acessível, linda, fácil de ler e cronológica. Nada mais prático. Indicado pra curiosos em ciências exatas como eu. Da alquimia à física de partículas (aliás, acho que isso é o subtítulo do livro), ele faz um resumão do que aconteceu nos fatos e nos bastidores dos eventos históricos mais relevantes da ciência que tenta explicar do que tudo é feito. Lindo, vale muito a pena ler. Empolguei tanto que até comprei o último que ele lançou, "Criação imperfeita", uma bicuda na tão perseguida "teoria de tudo". Não li ainda, mas ta na fila.
Demian - Hermann Hesse é um autor que faz parte da minha vida desde que li Sidarta a primeira vez. Na verdade, desde que li que Clarice Lispector se impressionou com "O lobo da estepe" de tal modo que quase pirou. E isso foi antes de eu ler "Sidarta" (confira resenha desta obra láááá em baixo). Para muitos, as três obras mais importantes do escritor alemão são as citadas aqui. São as únicas coisas que li dele. Tem uma máxima na literatura de que os grandes escritores estão sempre tentando contar sua história nos seus personagens e enredos. Hesse não foge à regra e eu o vejo em seus principais personagens. Para que nunca o leu, a ordem que sugiro é "Demian", "Sidarta" e "O lobo da estepe". Pois bem, Demian não é o personagem principal, ao contrário das outras duas obras. Um personagem, Sinclair, é que conta a história e se refere a Demian diversas vezes. Uma obra intrigante, pois os personagens nada têm de comum. Questionadores, inteligentes e complexos, eles adotam as mais diversas posturas e os mais inusitados fatos permeiam toda a narrativa. Mas já adianto, é do tipo que devassa nossa vida, pois nos vemos muitas vezes nas mesmas desgraças em que se encontram os personagens.
A grande arte - Rubem Fonseca. Ando devorando a obra desse mineiro e ganhei de um aluno um de seus principais romances. Tava passando da hora de eu ler o cara na literatura em sua forma extensa. Não importam quantas páginas você leia, o estilo é tão seco e objetivo que você não quer parar de ler. Lembro-me de não marcar com o lápis o parágrafo em que parei (tenho esse hábito) só pra retomar logo a leitura. É uma das histórias do advogado criminalista Mandrake. O final é... diferente do que eu imaginava. Não curti muito; mas todo o lance com as facas e a constante luxúria como um dos temas sempre são válidos na literatura do cara. Muito bom, mas ainda prefiro seus contos mais recentes. Claro, você reconhece todo o esforço do autor no romance; há muito estudo ali, sem sombra de dúvida. Sei lá, sou fã de contos também, né?
Quando eu terminar o "Branco neve, vermelho Rússia" eu conto pra vocês. A julgar pela capa, o livro é uma lindeza.

sábado, 18 de junho de 2011

anotações de um homem cinza (I)

Talvez isso vire um livro pra ser escrito em julho. 


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I

O meu hábito era tomar um banho às seis e dez naquela merda de chuveiro que não esquenta direito. Depois de vestir o uniforme, depois de comer o pão de ontem que o diabo sovou e tomar o café de marca barata, eu passava o gel no cabelo olhando no espelho que ficava em cima da cadeira que eu peguei da casa do meu padrasto. Anteontem olhei fixamente para minha cara, para o meu cabelo que precisava de aparo, esbocei um sorriso com as sobrancelhas voltadas pra baixo (eu gostava de parecer mau) e quando senti que minhas bochechas voltavam ao lugar assim como minhas sobrancelhas, a imagem do espelho descascado nos cantos continuou com a expressão. Senti um palor subir pela minha cara quando a vi dizer: “você é a imagem mais medíocre da derrota. Olhando assim pra você, não se pode sentir nem pena. Esse seu corpo macilento e essa eterna cara de segundo lugar são o perfeito espectro da incompetência humana. A verdade é esta: você é um derrotado. Olhe bem pra seus relacionamentos: a Diana, sua primeira e única namorada de verdade, deixou você porque você ‘era muito parado’; a Cláudia, a menina que você dizia ‘pegar’ para o povo da empresa nem sequer sabe da sua existência depois daquele beijo, bêbada, naquela ‘festa’ de bairro a que você foi – desacompanhado, diga-se; a Myrelli tem vergonha de falar pras amigas que deu pra você duas vezes de dó, de pura dó. Ela fala que deu porque estava a fim, mas ela deu porque acha que todo mundo merece comer alguém na vida, ou seja, é uma puta frustrada como você; a última é a Ceziane. Nessa você deposita uma fé de que vai dar certo, de que ela gosta realmente de você; não é bonita, nem é certa de corpo, é ‘legal’. Sabe o que aconteceu? Você diminuiu seu parâmetro para se sentir mais confiante. Mas isso não é ser superior, é reconhecer a sua ruína pessoal antes mesmo de tentar alçar qualquer voo. O que aliás seria uma estupidez descabida, já que se fôssemos aves, você seria a galinha aleijada sem asas. Entenda que suas ideias, o que dizem lá na igreja no domingo, que você frequenta somente por peso de consciência, você não ouve de fato o que dizem lá e quando ouve, não entende, entenda que suas ideias não são originais. Nada do que você faça alguém perto de você já não tenha feito. Você é o produto importado da China que amarela. Você é mais barato. A sua dignidade restringe-se ao fato social chamado trabalho. Naquela loja de colchões você realmente acha que algum dia vai se destacar, que vai passar o Cleber nas vendas, vai impressionar o Márcio e ele te elogiará na frente dos outros vendedores. Mas isso não vai acontecer. Não vai porque você nasceu estagnado. Você não lembra, mas nos dias em que ficou encubado pra ver se sobrevivia, você deveria ter escolhido não vir pra cá, deveria ter ficado lá dentro. Mas num esforço sobre-humano dos médicos, você veio à tona. Pela primeira (e não última) vez, não foi você quem decidiu. O tempo, a vida, as pessoas têm te empurrado. Seu tempo particular, psicológico, é atrasado, como o dos relógios paraguaios que seu pai vendia quando você era pequeno. A separação dos seus pais porque ele era um canalha e transava com todas as amigas da sua mãe (esse y você não herdou) aconteceu e parece que até hoje você não se deu conta disso. Seu pai superou, sua mãe superou, arranjou outro pra explorá-la e você, no fundo do seu raso âmago, acha que um dia eles vão voltar. Você tem vinte e três anos e esperança de nove! Entende o quanto é simplório? E ainda acha que os amigos ao seu redor são pessoas em que pelo menos você pode confiar... o Claudiosmar, seu ‘melhor amigo’, está, neste exato momento, se masturbando pensando na Ceziane. É provável que ele chegue nela antes de você. É provável que você se esquive quando ele vier te contar que a está ‘pegando’. É provável que você ache legal da parte dele te contar isso. Numa comparação, porque parece que você só entende as coisas ilustradas, é como se alguém enfiasse os dedos nos seus olhos só pra saber como é o prazer de fazer isso, e você ainda deixasse!! O Tibúrcio disse ontem, bem atrás de você, e é bem possível que você tenha escutado e, na sua covardia estonteante, tenha fingido que não ouviu, ele disse que sua calça é um número maior do que os 36 que você usa e que sua bunda desaparece com a camisa frouxa, mal disposta nas suas costas. Mas ele não disse por brincadeira, fazendo troça como fazem os amigos. Disse isso porque é importante para ele humilhar alguém pior do que ele, alguém que esteja num patamar mais raso que o dele. Você é essa pessoa educada, humilde, ‘gente-fina’, faz tudo o que te mandam, tudo. Incrível como ainda não te chutaram a cara, o tanto que você erra quando faz aos outros. Já reparou que a palavra que você mais usa é ‘desculpa’? Você se desculpa por tudo e com todos. Imagino que já tenha passado pela sua cabeça pedir desculpas a alguém por você existir, mas não, você não tem essa capacidade de reflexão ou noção de se autopunir para atingir um outro patamar. Você está na sombra, fora do radar das reprimendas do crescimento. Você está na sobra. Você está no canto cinza da existência, no morno, resultando todos os dias da ingratidão humana frente a seus inúmeros desafios. Mas você não é vítima. A vítima é o resultado de uma injustiça. Você se sacaneia. Você se sabota. Você cria todas as condições necessárias para a humilhação diária. Essa é a sua única casca: a sensação de resistir a insultos e mágoas sem se ferir profundamente. Ironicamente, o que te salva é exatamente o que te torna tão pueril e diletante.”
Depois disso eu fiquei meio aéreo; resolvi por um lençol azul desbotado que eu peguei na casa da minha mãe sobre o espelho de bordas alaranjadas. Que droga, eram cinco pras sete e eu tinha que entrar às sete e meia na terça, porque era dia de balanço. Cheguei atrasado quase trinta minutos e o Márcio me deu um esporro daqueles. Acho que preciso acordar mais cedo.


sábado, 4 de junho de 2011

texto do outro

Abaixo eu reproduzo o texto de um dos meus mestres (e olha que ele nem foi meu professor formal!) Alexandre Costa sobre o debate acerca do livro do MEC. Já me posicionei sobre o assunto, mas ele fala com a propriedade que lhe cabe como linguista. 

A 'inguinorança' dos puristas hipócritas
A polêmica sobre a aprovação do MEC à distribuição de um livro que incentivaria os "erros de português" tem mais "equívocos" do que aqueles que possam ser encontrados na obra. A ignorância sobre a questão passa pela absoluta desinformação sobre o que seria, de fato, "erro", "gramática" e "uso" e mesmo a tal "unidade da língua nacional".


Assim, por exemplo, quando a obra afirma que seja possível falar "os livro" ou "nós pega os peixe", não estaria, em princípio, incentivando que as pessoas cometam "erros", mas assumindo um fato que é cientificamente provado há décadas pela linguística brasileira. Todos os falantes da língua portuguesa brasileira cometem tais "erros" na fala. Nos dois exemplos, há erros de concordância apenas, e somente de concordância de número.

As línguas são redundantes, ou seja, todas têm a propriedade de repetir elementos formais e semânticos para compensar o "ruído" que possa dificultar a comunicação. Por isso que qualquer falante do português encontrará a marca do plural nestas frases: 1.as casas verdes são maiores; 2. as casas verde são maiores; 3. as casa verde são maiores; 4. as casa verde são maior; 5. as casa verde é maior.

Nenhum falante eliminará a marca de plural do artigo e algumas das frases são menos produtivas, quer dizer, mais improváveis, sobretudo a de número três. O uso da língua funciona de modo complexo e regular e nenhum dos exemplos é mais complexo do que o outro, são apenas diferentes. A ideia de que uma determinada variedade idiomática seja melhor do que outra é milenar e advém da identificação da língua oral à língua escrita, com privilégio para a segunda. Esse fenômeno tem a ver com o uso da escrita para o registro de textos sagrados e legais, ou seja, diz respeito ao valor simbólico dos discursos religiosos, políticos e jurídicos, cujos efeitos se impregnaram na língua escrita.

No entanto, em todas as épocas e lugares, "uma língua" sempre funciona, na realidade, como "várias línguas". No nosso caso brasileiro, e de modo muito simplificado, o português que nos chegou foi resultado da variação diacrônica do galego que também passa pelo espanhol. Aqui já estavam os povos indígenas e, durante séculos, foram faladas em nosso território as chamadas línguas gerais: misturas de várias línguas indígenas e de variedades do português de Portugal. Depois vieram os escravos e migrantes, e a língua portuguesa do Brasil nunca foi e nunca será a de Portugal (aliás, é a língua portuguesa de Portugal que tem ficado mais "brasileira" pela influência da mídia...).

No entanto, até bem pouco tempo, insistia-se na colocação pronominal portuguesa em detrimento da brasileira. Hoje em dia, basta assistir televisão para ver que no Jornal Nacional isso permanece como regra. Seus repórteres dizem cotidianamente "Me contaram", "Nos informaram", "O prenderam" e ninguém escreve cartas ou artigos sobre a recorrência dos "erros de colocação pronominal" na mídia.

Um "erro grave" é sempre o "erro do outro". Em Goiânia, se escuta "nós vai" com tanta frequência como se ouvirá, em Porto Alegre, "tu fez". Mas não se escreve assim nos jornais. Isso é um fato. Outra coisa, bem diferente, é o modo como a escola deve tratar a relação entre a língua escrita e a falada no processo de aprendizagem da comunicação pública e, sobretudo, no estudo da ciência e da cultura.

A modalidade oral é anterior na nossa formação social. Aprendemos a falar interagindo com a família e o mundo. Aprendemos a falar agindo, e nenhum pai, em sã consciência, fica corrigindo os "erros de português" de seu filho nos seus primeiros anos. Haverá, claro, aquele que passará a fazê-lo mais tarde, sem perceber que comete os mesmos erros de vez em quando. Corrigir o português do outro é uma perversidade atávica que herdamos de nossa origem colonial: há um prazer maldoso em subjugar a fala do outro.

No processo de formação escolar, os estudantes têm de conhecer e aprender a língua padrão escrita para ter acesso aos já citados discursos privilegiados da cultura, da religião e da ciência. Isso já está posto em nossos currículos desde a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais, cuja formulação envolveu estudiosos de todo o País. Mas a correção gramatical não é o primeiro nem o mais importante fator para a aprendizagem da língua padrão. Antes de aprender a "não errar", precisamos aprender a "acertar".

Os estudantes necessitam de motivos para estudar. O acesso à leitura e à escrita deve dar-se em atividades significativas cujo valor os leve gradualmente ao mundo adulto e público. Nenhum adolescente vai interessar-se por um texto machadiano se nunca refletiu sobre si mesmo; nenhum aluno vai gostar de ler Grande Sertão: Veredas , se não refletiu sobre a beleza da variação linguística. Além disso, para aprender a ler e a escrever é preciso aprender a falar e a escutar. Mas não "corretamente" apenas: é preciso aprender a falar, escutar, ler e escrever "atentamente".

A correção gramatical só é relevante quando vem por último: primeiro, é preciso falar muito, escutar muito, ler muito e escrever muito; depois, é preciso refletir sobre os modos e os sentidos dessa atividade linguística, e suas possibilidades de expressão; e só mais tarde haverá razão para usar a metalinguagem gramatical como ferramenta para a aprendizagem da língua padrão. Sim, a aprendizagem gramatical é importante. Aliás, seu valor é mais relativo à lógica e à estrutura da linguagem e do conhecimento do que à mera "correção linguística". Ninguém precisa estudar gramática para aprender a falar ou escrever corretamente: basta ouvir e ler e consultar dicionários - e decorar... É isso que a maioria dos "campeões da correção linguística" faz: decoram. Apesar de honrosas exceções, não sabem gramática nem como tradição nem como ciência. Suas apostilas, na maioria dos casos, são cópias de boas gramáticas tradicionais.

Enfim, aceitar que se fale ou que se escreva com "erros" - ou melhor, com padrões de concordância da fala, neste caso - não significa que se deva deixar de, em algum momento, e de modo produtivo e adequado, ensinar a variedade padrão escrita e a oralidade letrada padrão. Aprender a usar a língua e a conhecer o mundo da cultura que nela se encontra e se constitui é algo muito mais complexo do que questões de ortografia ou concordância.

A "grande polêmica" sobre o tal "incentivo ao erro de português" aprovado pelo MEC só impressiona a quem não conhece os verdadeiros problemas da educação brasileira. Os mais ferozes e vorazes debatedores, via de regra, nunca pisaram numa escola pública de periferia. Mais do que desinformado, esse debate é hipócrita.

A linguagem é a peça-chave do processo educativo e envolve questões, problemas e métodos absurdamente mais complexos do que esse tipo de debate enseja. Vá à escola do seu filho e pergunte a professores, coordenadores e diretores sobre o planejamento interdisciplinar e transversal da escola. Se a disciplina de língua portuguesa não estiver no centro dessas atividades, caso elas existirem, é sinal de que seu filho está perdendo os melhores anos de sua vida com atividades burocráticas e emburrecedoras.

Não há nada, enfim, a reprovar na obra aprovada pelo MEC, pelo menos com relação às críticas feitas. Se existe algum problema a ser debatido é o fato de alguns formadores de opinião divulgarem e promoverem a desinformação.

domingo, 8 de maio de 2011

pq atheneu facts

Bem, com o único objetivo de trollar meus amigos que moram longe (ou se entocam, como preferirem), mais especificamente num bairro afastado de Goiânia (duplo sentido on), o incrível Parque Atheneu, criei uma hashtag no Twitter intitulada Parque Atheneu Facts. Seguem agora todos os fatos sobre esse nobre e longínquo bairro goianiense que faz fronteiras continentais. A brincadeira é saudável e muitos habitantes dessa ilha gostaram da ideia e me mandaram algumas pérolas, como "O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que a AIDS nem chegou lá ainda, ficou no HDT." Fazendo referência ao hospital que fica próximo à entrada do condomínio. 
Um cheiro pra vocês. Apreciem e retuítem.
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Percebam o tamanho e isolamento desse bairro forever alone



·         O pq Atheneu é tão longe, mas tão longe, que o ônibus coletivo pra lá tem banheiro. 
·         O pq Atheneu é tão longe, mas tão longe, que lá tem sotaque próprio.
·         O pq Atheneu é tão longe, mas tão longe, que a saída pra São Paulo lá é conhecida também como entrada pra São Paulo.
·         O pq Atheneu é tão longe, mas tão longe, que a venda da esquina fica na linha do Equador.
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que a população lá não é bairrista, é patriota. 
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que enquanto Goiânia era planejada, lá estava sendo descoberto.
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que as pessoas de lá se cumprimentam usando a saudação romana "ave!".
·         O Pq. Atheneu é tão longe,mas tão longe, que o filme "Os mercenários" foi filmado metade no Brasil e metade no Pq. Atheneu.
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que Judas achou lá suas botas.
·         O Pq Atheneu e tao longe mas tao longe que os computadores de la com acesso discado nao tem acento ou pontuacao
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que o clima tenso no Oriente Médio afeta as vizinhanças do bairro. 
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que a grandeza "pra caralho", que tende ao infinito, foi criada numa viagem de ônibus pra lá.
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que lá tem comidas típicas.
·         O Pq. Atheneu, na verdade, nem é tão longe assim. #PrimeiroDeAbril 
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que esqueci uma agenda 2010 lá e, quando fui buscar, já estávamos em 2011.
·         O Pq Atheneu é tão longe, mas tão longe, que dá pra comprar muambas paraguaias por lá apenas atravessando uma rua.
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que as imagens ao vivo feitas lá têm delay ao aparecer no telejornal de Goiânia.
·         Gente, entenda: eu não odeio o Pq. Atheneu, só estou listando uns pontos pra justificar a nossa ida até lá. Ou o fato de lá ser habitado.
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, mas tão longe, mas tão longe, mas tão longe, mas tão longe, mas tão longe, mas t...
·         O Pq. Atheneu é tão longe, que Julio Verne quando escreveu "A volta ao mundo em 80 dias" tinha pensado no Pq como enredo.
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que lá tem bandeira e hino próprios.
·         - Ondcê mora? - Lonj pa caraio. - Pq. Atheneu? #diadapoesia
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que o ensino lá é a distância. 
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que os parqueatheneuenses são também conhecidos como imigrantes.
·         O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que os animais de lá não receberam nome científico ainda. 
·         O Pq Atheneu é tão longe, mas tão longe que tem uma nova operadora de celulares chegando por lá: Americel 
·         O Pq Atheneu é tão longe, mas tão longe, que os números de telefone lá só têm sete números.
·         O Pq Atheneu é tão longe, mas tão longe, que estão estudando cobrar pedágios nos dezoito quebra-molas, da cidade até lá.
·         O Pq Atheneu é tão longe, mas tão longe, que a quarta-feira de cinzas cai na sexta lá.
·         O Pq Atheneu é tão longe, mas tão longe, que se o mundo fosse quadrado, lá ficaria numa quina. 
·         O Pq Atheneu é tão longe, que quando você está indo pra lá, quando chega, já está na hora de voltar. (E vc está atrasado)
·         O Pq Atheneu é tão longe, mas tão longe que para chegar lá é preciso passar pela alfândega. 
 O Pq. Atheneu é tão longe, mas tão longe, que quem decide ir morar lá precisa de green card. 

quarta-feira, 30 de março de 2011

o cacho de uvas e a raposa (desfábula)

      Certa vez um cacho de uvas passeava por um pomar quando deu com um pé de raposas carregado. Notou que uma das raposas estava madurinha e mais baixa que as demais, pronta para ser abatida. Tomou distância e, num salto como nunca saltou, raspou o talo na cauda da raposa, mas não alcançou seu objetivo.
      Cansado e com muita tanta fome, mas deslumbrado com a possibilidade, tomou mais distância e, com ainda mais força, saltou mais alto que anteriormente, desta vez conseguindo dependurar-se no vistoso rabo da raposa. Porém, ainda não seria daquela vez, ele acabou escorregando.
      Quase desistindo da empreitada, um pensamento chinês perpassou sua cabeça de uva: "melhor morrer tentando que desistindo", e isso o encheu de coragem e força de vontade. Num salto com vara de tão alto (mas obviamente sem vara), alcançou a raposa e conseguiu colhê-la para, então, devorá-la finalmente com imenso prazer.

MORAL: A ordem dos fatores altera o produto

sábado, 19 de março de 2011

adote um carro pequeno

Tenho falado desse assunto constantemente em sala de aula com meus alunos. Chegou a hora de verbalizar por escrito. 
*
      Goiânia tem hoje a maior frota de carros do país, proporcionalmente. Tem a segunda maior frota de motocicletas, em números absolutos, ficando atrás apenas de São Paulo. A última estimativa que li, dava conta de que há um automóvel para cada 1,7 habitante. Fora isso, a capital de Goiás tem um trânsito estrangulado e, em horários de pico, as histórias de São Paulo a que assistimos pela tevê parecem com as nossas: engarrafamentos, ruas apertadas, perda de tempo, estresse. O carro está virando nosso segundo lar/escritório. Cada dia vemos mais pessoas "trabalhando", lendo, comendo e usando o veículo não só para o que ele foi destinado (e que não cabe colocar nesse blog de família).
      O goiano adora ter seu veículo. Pra nós, é uma questão de sucesso mostrar aos demais que temos o nosso carro. Os outros compactuam com essa ideia e aqueles que ainda não têm os seus, não veem a hora de os ter. Ninguém quer metrô ou um transporte coletivo de melhor qualidade. Quer andar em seu carrinho. De preferência sozinho, afinal, goiano que é goiano não dá carona, vai pro mesmo lugar com um bando de outras pessoas desacompanhados em seus carros. Repare no próximo churrasco da faculdade/colégio a que você for: cada um no seu quadrado.
      Mas isso não é tudo, o goiano, em especial o goianiense, adora carro grande. A moda dos SUVs (Special Utility Vehicle, na sigla em inglês, ou "utilitário premium") na Europa já passou faz anos. Nos EUA, onde as avenidas são largas e há transporte público de qualidade, ainda existem muitos carrões. No entanto, as cidades norte-americanas não foram projetadas para cinquenta mil habitantes como Goiânia (que hoje abriga 1.301.892 de pessoas). Aqui, o cara adora ter um carro gigante, mesmo que ele more sozinho e não utilize todo aquele espaço interno. E o que dizer das caminhonetes? Não bastasse a cultura sertanejoide da cidade (músicas, bares, vestimentas, gírias...), ter uma caminhonete nesta cidade é sinônimo de status. Teoricamente ela é destinada para o campo, para carregar objetos, utensílios, produtos da roça, enfim. O curioso é que a maioria delas não vê nem poeira. Não chegam de fato a ir pra roça no final de semana e desfilam pela cidade com capotas maritmas tampando um vão de um metro e meio vazio. Ou pior, lotado de som para disparar os alarmes dos milhares de carros estacionados pelas ruas.
      Numa rápida comparação, os carros grandes (SUVs e caminhonetes) têm em média de quatro a seis metros de comprimento. Na outra ponta, os carros chamados populares (exceto em seus preços) têm entre 3,60m e 3,80m. Para se ter uma noção, os minis medem entre 2,70m (Smart Fortwo) e 3,55m (Fiat Cinquecento). Em outras palavras, quem têm uma F-250, com seus imensos 5,83 de comprimento, ocupa o espaço de dois Fortwo com uma distância de 43cm ainda entre eles. Se formos fazer conta, considerando o número desses trogloditas com rodas, veremos que eles contribuem substancialmente para a piora de nosso trânsito, pois ocupam um espaço que não precisariam ocupar. 



      Mas a cultura da modinha, ah, essa danadinha... O goianiense não suporta a ideia de ter um carro pequeno. Ele quer um carro cada vez maior. O argumento "quem anda num carro grande não consegue mais andar em carro pequeno" é tão ridículo quanto "jogar só um papelzinho de balinha no chão não sujar a cidade", mas é o preferido entre as pessoas que dirigem esses caminhões de passeio. Eu entendo as famílias que têm aí, sei lá, três, quatro filhos possuírem um veículo que os caiba confortavelmente em seus passeios ou viagens. A propósito, acredito que todos nós temos direito ao conforto. Porém, quantas famílias de fato hoje têm essa quantidade de gente? O perfil dessa instituição tem mudado bastante nos últimos anos. As pessoas têm trabalhado mais, assumido mais sua condição homossexual, constituído famílias de dois membros (sem duplos sentidos, per favore), tido apenas um filho... Pra que ter todo o conforto de uma Hillux se se pode ter todo o conforto de um Aircross (ainda um carro grande, caro, mas "chique")? Só nessa comparação obtém-se um metro de economia. Isso porque estamos falando apenas dos carros. As motos, mesmo as grandes, ocupam espaços inferiores aos menores carros disponíveis no mercado.
      Por falar em economia, os transformers também consomem mais. O Tucson, por exemplo, faz uma média de seis quilômetros/litro. É muito pouco comparado ao que se faz num Uno, quase três vezes mais quilômetros rodados. 
      É preciso transporte público de qualidade? Sim. As pessoas têm de dar mais caronas? Sim. Têm de andar mais de moto, bicicleta e a pé? Sim. Os viadutos, as ondas verdes nas grandes avenidas e a eliminação das rotatórias ajudam na melhoria do trânsito? Sim, mas como paliativo, já que a população não para de crescer e comprar carro. A cultura do carro grande precisa mudar? Sim, e esse é o sim mais importante de todos, uma vez que se essa cultura dos carros enormes mudasse, teríamos muito mais espaço nas ruas e um problema muito mais facilmente remediado.
      No final das contas, tentando evitar o colapso do trânsito de Goiânia, nem defendo tanto o combustível mais barato. Se isso acontecesse nessa semana, o colapso na capital não ocorreria nos próximos anos, mas nos próximos minutos. Acho que vou encabeçar uma campanha: 
"Quer ser chique? Troque seu SUV por um mini".


sábado, 5 de março de 2011

é rata

Twitter, gêneros textuais/discursivos, tweet, hashtag, texto, hipertextos, azul, coluna, Al Gore, Campus Party, #FicaDica

Todas essas palavras no texto "gênero novo" estão destacadas com hiperlinks que deram muito trabalho pra eu os escolher e que, só hoje, descobri num outro pc que não aparecem destacadas no blog. Terei de mexer nas configurações. É como construir um castelo de cartas e depois alguém dizer que ele não é válido, que aquelas cartas não são sequer enxergadas. Shit. 
Então, para quem interessar possa, as palavras acima naquele texto levam a outros vários textos, como é a função do hipertexto. 

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

histórias extraordinárias

      Não tenho medo de confessar que comecei a ler tarde. Nem que conheço muito pouco ainda de tudo o que tenho vontade de ler. Ainda restam muitos "clássicos" e outros nem tão falados assim, mas igualmente importantes. Estou no meio do meu processo de formação como leitor e tenho orgulho de ter consciência disso, como aquela neurocientista que teve um derrame e tentou sozinha racionalizar o que acontecia com ela. Assista ao vídeo (1 e 2), é muito divertido e bonito.
      Edgar Allan Poe era, para mim, um clássico que eu precisava ler, sobretudo porque sou um apaixonado por literatura fantástica e ele é seminal nisso e na literatura policial, como se pode ver no conto "A carta roubada" e "Assassinatos na rua Morgue" (este não tem na minha coletânea), ambos com o investigador Dupin, uma espécie de pré-Sherlock Holmes. Se Poe não tivesse morrido tão cedo, quem sabe não tivesse escrito mais histórias como as citadas e Dupin não fosse tão famoso como o investigador inglês. O certo é que "A carta..." é muito instigante. Quando assisto a minhas séries policiais, tenho aquela mesma sensação ao ler o conto. A diferença é que na literatura nós é que dirigimos a história, e nossa imaginação é responsável por todo o processo de criação - junto ao texto.
O primeiro conto da coletânea, "Ligéia", me deixou chateado. Esperava algo mais pungente e curioso. É soturno, e num romantismo de lirismo meio insosso encheu um pouco minha paciência. Impressão que foi desfeita na maioria dos contos seguintes.
Notei que os narradores de Poe nessa coletânea são todos personagens e contam suas histórias sob a perspectiva da primeira pessoa, o que nos aproxima dos acontecimentos narrados. Gosto da primeira pessoa, mas queria ter lido algo dele em terceira também. Às vezes é coisa do autor. O Saramago gosta de explicar os nomes dos personagens no começo de suas obras e sempre há cães nelas. Estilo.
      "Gato preto" é um clássico que eu já tinha lido há muito tempo. Lembro que na época a sensação que me causou foi de estranheza. Dessa vez, a releitura foi rápida, deglutiva, rascante e deliciosa no desfecho. Era isso que funcionava! Esse conto é recomendado pra todo mundo que gosta de histórias mais macabras e bizarras. Dá vontade de reler trinta vezes.
      Um dos contos que mais me chamou a atenção foi "O sistema do doutor Alcatrão e do professor Pena". Tenho um gosto especial por histórias de hospício desde a leitura do clássico "O alienista", do Machadão. E, óbvio, é inevitável fazer a intertextualidade entre os dois contos. Aliás, impossível também não se lembrar do ótimo e trágico "Só vim telefonar", do García Marquez em seus Doze contos peregrinos. Vale a leitura dos três. Aquele ambiente, o discurso "não estou louco" e a vulgar conclusão "todos estão loucos" não tira o brilho de nenhum deles, e o de E.A.P. é bem divertido.
Capa da versão da Cia. das Letras
      "O poço e o pêndulo" é outro nome-fácil dessa leva de literatura e vale ser lido inúmeras vezes também. Que incríveis as imagens de games como "Resident evil" ou "God of war" podem ser resgatadas lendo essa história. Macabríssima.
      Gostei excessivamente de "O escaravelho de ouro", pois passei parte da leitura lembrando do "O escaravelho do diabo", obra de Lúcia Machado de Almeida, da clássica série Vaga-lume, que muitos de nós lemos nos anos 8tenta. Em comum com a obra infanto-juvenil, um escaravelho, uma história de mistério que tem uma reviravolta muito bacana no clímax. Nada que não vejamos hoje no Law and Order: special victims unit, mas pra época aquilo era soberbo. Foi das histórias que mais gostei, destaque para a engenhosidade do autor para pensar em tudo aquilo e fazer todos aqueles cálculos. Eu admiro escritores da literatura que sacam de matemática.
      "William Wilson" também é bem estranha e desperta bastante curiosidade no leitor por ter o personagem um tipo de sósia que o persegue e o irrita na mesma medida que o complementa. Desfecho muito bom.
      Demorei meses na leitura das dezoito histórias extraordinárias de Poe, pois como gosto sempre de fazer, leio devagar, no meu tempo, sem pressão ou obrigação. E posso assegurar, ler assim é muito melhor que obrigado, como ocorre com meus pobres vestibulandos. 
      Ó, a versão que comprei dessa obra é da Cia. de bolso, cujos livros são mais baratos, têm boa diagramação e páginas amarelinhas que não cansam a visão. Pra todos que gostam de uma esquisitice em primeira pessoa, aconselho buscar os contos na net (são domínio público, não tema os direitos autorais) ou mesmo adquirir a obra, já que é barata e ler em papel é melhor e mais saudável que no browser. 
      Vai lendo! Próxima resenha deve ser do Rubem Fonseca, comprei uma pá de livros desse velhote de mente pervertida.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

gênero novo

      

       Ando escrevendo muito no Twitter e pouco por aqui. O fato é que escrever 140 caracteres, hoje, parece mais fácil do que quando ingressei nessa rede social. Com meu olhar contínuo sobre os gêneros textuais/discursivos, notei que não só o tweet é um gênero novo, análogo aos SMSs (também conhecidos por "torpedos" ou simplesmente "mensagem"), como também a etiqueta que acompanha muitos deles, a chamada hashtag
      A hashtag é também um gênero, mesmo se compondo às vezes por apenas uma palavra. Aliás, o que define um texto não é a quantidade de palavras, frases, períodos, parágrafos que ele possui, mas sua capacidade expressiva e comunicativa, a qual interliga os participantes de um discurso, chamados na produção textual de interlocutores. 
      Além de gênero novo, a hashtag é também um gênero pertencente à categoria dos hipertextos. Os hipertextos são textos produzidos na internet dada a facilidade de um texto levar a outro nesse ambiente virtual. O hipertexto se mostra na internet por meio dos hiperlinks, palavras sublinhadas e destacadas em azul (neste blog, é vermelha a cor). Ao clicar neles, acontece um redirecionamento de página e o leitor é levado a uma outra página (dentro do mesmo site ou não) em que aquele termo destacado aparece também ou onde há uma maior explanação sobre ele.
      No caso das hashtags do Twitter, quando se clica sobre elas, é-se direcionado a uma coluna dentro do próprio site em que aquela sequência foi usada por outro. No site em questão, esses marcadores são precedidos pelo símbolo #. Assim, quando um participante do Twitter escreve algo com uma etiqueta dessas, ele se junta aos outros que também a utilizaram, independente de segui-los ou não. 
      Pra você, leitor, que gosta da rede social que mais cresce no Brasil, participe ativamente na internet. Como disse o Al Gore (ex-candidato à presidência dos EUA) na Campus Party, a gente tem de aproveitar a internet enquanto ela ainda é um ambiente verdadeiramente democrático (pra mim, anarquista até), vai saber do futuro... #FicaDica

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

primeiro post

      Hoje deu vontade de escrever. Tenho um conto em andamento, tenho que começar a elaborar propostas de redação para o semestre, tenho uma qualificação de doutorado para corrigir. Bastante coisa pra quem está de férias, né? Mas me bateu vontade de escrever. E eu acho que é uma das primeiras vezes que escrevo neste blog sobre.... nada. Eu não tenho assunto nenhum para me motivar a escrever e mesmo assim eu continuo. O que houve com minha preguiça?
      Aliás, tenho uma teoria sobre esse pecado capital. Gula, inveja, ira, avareza, vaidade, luxúria... todas essas coisas você comete. Você é o agente do pecado, portanto, você é o responsável por ele. No entanto, com a preguiça acontece o oposto. Você é paciente da preguiça, ou seja, não é você quem a comete, é ela que te acomete. Assim, os pecados capitais deveriam ser seis ao invés de sete. Porém, o círculo não se fecharia direito, já que sete é um número mágico.
      Falando nisso, tenho uma atração maluca pelo sete. Desde sua forma, 7, passando por sua escrita, SETE, a presença dele na data do meu nascimento (17/07/78 - pronto, falei a idade) até todo o misticismo que existe sobre ele ser o número da perfeição. Não sei explicar minha atração por coisas místicas, eu, tão cético quanto mais física leio e mais velho fico.
      E o que seria de nós, me surpreendo me perguntando, e o que seria de nós sem essas básicas contradições? A vida parece mesmo pautada pelos nossos acertos e, sobretudo, por nossos erros. A lógica da contradição está no fato de que, ao nos contradizermos, podemos persistir no ridículo ou tentar consertá-lo. A contradição parece sustentar nossa vida, como nossas duas pernas. Damos um passo a frente (o acerto) e outro passo a frente (o erro). É isso mesmo, o erro é que conduz nossas vidas, tal como o acerto. E tudo isso porque medimos nossa vida partindo do pressusposto da grandeza tempo.
      Complicado? Também acho. Inclusive, quando o povo da física fala que tempo e espaço estão entrelaçados, e que a gravidade existe e poderia ser verificada quando uma deformação nessa teia espaçoXtempo.... quando o povo da física fala disso, eu dou uma pirada. Sério.
      Eu queria escrever mais, bem mais, acontece que eu fui acometido pela preguiça. Estou de férias, então é natural que eu queira fazer nada. Até achei que minha leitura de Poe nas férias ia ser rápida por causa das chuvas que me impedem de sair de casa da quantidade de ócio que eu tenho acumulada. Que nada, to achando tudo meio enfadonho. No próximo conto, o famoso "Gato preto", as coisas devem melhorar.
      Tenho que escrever sobre algo sério. Preciso achar um tema sério pra tratar. Estou com vontade de escrever a sério. Já mencionei hoje que estou com preguiça?
      Desconsidere essa tessitura emaranhada. Mas volte nos próximos posts. Valeu.