terça-feira, 25 de outubro de 2011

neve vermelha

Sofri para ler Branco neve vermelho Rússia, da polonesa Dorota Masłowska. Eu não sou fã de beatnik, literatura à qual a autora parece se afinar bastante. Os intermináveis fluxos de consciência e discursos indiretos-livres dominam toda a narrativa, que se limita a alguns poucos fatos, entrecortados por muita viagem de anfetaminas e pouco sexo. Esperava mais sexo nesse livro, não sei. Os drogados poloneses retratados por Dorota não transam.
A história de um personagem sem-lugar em seu país é o duto que escoa, pelas letras de Dorota, a realidade de uma parcela do povo polonês, sem referencial depois do mundo não ser mais bipolar. (aliás, acho que o mundo está é cada vez mais bipolar)
Demorei de agosto até semana passada (outubro) pra conseguir ler o livro. Simplesmente não fluía. Essa chapação toda me enche o saco. Não suporto juventude sem perspectiva e querendo ser sem perspectiva e não tendo outra alternativa a não ser: não ter perspectiva. 
A história não tem início. Da mesma forma, também não tem fim. O enredo nada mais é que um recorte na vida do personagem. Não sei se é porque sou muito ligado à tradição da narrativa com todas as reviravoltas que culminam num clímax, qualquer clímax, e depois se desfecham (ou acabam antes disso), mas pra mim BNVR é verborragia pura. Admito que é massa ver uma jovem de 18 anos (na época da publicação do livro) publicando um livro que foi traduzido para várias línguas, ganhou alguns prêmios e chamou a atenção pela "ousadia" discursiva e, guardadas as devidas comparações, originalidade. Criei expectativa demais com a história. Esperava algo retumbante como a Clarice em suas primeiras obras. Nada disso; literatura ruim pra mim, apenas.
Reforço, entretanto, que considero importante ler de tudo. Várias vezes me passou pela cabeça desistir daquele livro, mas a persistência em me firmar como leitor disciplinado superou essas vontades. 
Não conheço mais dessa autora, não sei se publicou outras coisas. Se o fez, não vou atrás pra ler: tenho uma pilha enfileirada em dominó pra eu ler. Mas se cair na minha mão novamente e tiver uma proposta diferente dessa, posso até me arriscar. Sei lá, daqui uns dez anos.

domingo, 2 de outubro de 2011

referências

Referências são os pontos para os quais olhamos e para onde queremos ir. Referências são as bases nas quais nos sustentamos para seguir em frente. Referências nos estimulam, nos incitam, nos fazem refletir, querer alcançar pontos inalcançáveis. Referências nos emocionam, mas sobretudo referências nos tornam seres vivos e pensantes. Uma pessoa sem referências é uma pessoa ignóbil.
Dia 28 de setembro, pouco antes de dormir, minha timeline do Twitter foi invadida por uma notícia que eu não quis aceitar e pensei tratar-se de trote: o vocalista do Cólera, Redson, morreu de uma parada cardiorrespiratória. Antes de dormir, dei a notícia à minha mulher, adormeci às lágrimas incontidas.
O outro dia foi uma merda. Dei aula sem graça. Perguntavam do Rock In Rio, eu contava brevemente como tinha sido, voltava pra matéria tentando esquecer que o rock faz parte da minha vida.
Estive um dia de luto. Um dia. Na sexta eu já estava ok, porque o Redson não morreu de verdade. Eu o vejo nos meus álbuns do Cólera, nas letras dele, nas músicas, nas fotos. Vejo-o nas minhas letras, nas minhas músicas, nas escolhas que fiz pra vida. Ele foi mais importante pra mim do que muitos parentes próximos. Se hoje penso que pode haver um amanhã melhor pras gerações que vêm, é porque na minha adolescência eu conheci o Cólera e as letras e músicas do Redson. 
"Quanto eu passo as noites nas esquinas/ esperando um ônibus que nunca vem/ vejo mulheres prostituídas, tento imaginar por quê/ vejo moleques, rasgados, perdidos, não têm um amigo/ mas por quê?/ Dê uma olhada pra essas vidas/ onde estão os direitos de viver?/ Eu me lembro, falam na declaração/ que nascemos livres, livres, por iguais/ mas não entendo se escolhemos/ ou se alguém escolheu por nós/ não está certo, alguns estão ricos/ outros não têm nem um amigo/ Dê uma olhada pra essas vidas/ onde estão os direitos de viver?"
Depois de ouvir/ler essa música aos meus 16, 17 anos, eu nunca mais fui o mesmo. A partir dali, eu estava num processo irreversível de transformação para buscar um mundo melhor e de lá pra cá, pouca coisa mudou. Fiquei mais embrutecido, menos sensível, mas ainda acreditando. Perdi a inocência, mas não o otimismo. 
Sangue Seco com Redson ao centro em 2007, em Palmas
Eu perdi um ídolo, mas suas ideias nunca morrerão em mim ou nos outros moleques de 16, 17 anos que estão conhecendo o Cólera agora e transformando suas vidas concretamente. O discurso soa religioso, eu sei. Mas a indignação e o inconformismo não fazem parte de adorações, mas de detestações. O mundo punk compartilha isso, independente da corrente ideológica. Todo punk é um indignado. Os que têm o Cólera como referência, além de indignados são otimistas. 
No sábado, 1º, teve um show histórico em Goiânia. Olho Seco, banda seminal do punk junto ao Cólera, tocou aqui na cidade, voltando às atividades depois de quase uma década parado. O Ímpeto, uma de minhas bandas, abriu mão de tocar as próprias músicas no show de abertura desse evento e tocou apenas Cólera, do começo ao fim. Foi nosso jeito de homenagear aquele que nos influenciou. Se tocamos alguma coisa, muito se deve ao Redson e ao Cólera. As pessoas gostaram, choraram, cantaram conosco e fizeram um espetáculo lindo. Aquele espírito é o que temos de carregar conosco no dia a dia pra enfrentar todas as pedras que jogam na nossa cara toda hora. Pra aguentar a merda do mundo, preciso fazer algo que vá contra ela, preciso acreditar que ser adolescente não é uma fase, mas uma escolha de vida. "Eles dizem que você é doente, e que isso é fase de adolescente mas não! Não vá se entregar!", gritava o Redson no melhor disco do Cólera: Pela Paz Em Todo o Mundo. Nunca ouviu? Baixe aqui.
Eu hoje estou feliz. Feliz porque sei que o Redson cumpriu seu papel aqui. Foi embora cedo, "os bons morrem jovens", cantava Renato Russo mais uma verdade. Morreu cedo, mas não deixou nada a dever a ninguém. Só a crescerem cada vez mais. FORTE E GRANDE É VOCÊ!!!